Denúncias de intolerância religiosa crescem 330% em 1 ano; MP orienta sobre limite sonoro em cultos

O número de denúncias de casos de intolerância religiosa contra religiões de matrizes africanas têm crescido na Bahia. Segundo dados do Ministério Público, apenas neste ano já foram registrados 56 casos, sendo que apenas um deles não foi direcionado para prática religiosa de matriz africana. No ano passado, foram registrados 13 casos. Isso significa um aumento de 330% em um ano.

Motivado pelo aumento, o órgão expediu uma nota técnica que orienta os promotores sobre a imposição de limites sonoros durante cultos e liturgias de religiões de matriz africana. De acordo com a promotora Lívia Santana, muitas denúncias de poluição sonora que chegam ao MP são, na verdade, casos de intolerância religiosa sobre os cultos praticados nos terreiros de candomblé, e não crime ambiental.

“A nota orienta que os membros do MP analisem com mais afinco esses casos, antes de assinarem um termo de ajustamento de conduta, antes que inviabilizem a atividade do terreiro, obrigando a fazer isolamento acústico, por exemplo. Que se coloque na balança os dois direitos, liberdade de crença e do ambiente”, explicou a promotora.

Ainda segundo ela, em alguns casos realmente acontece a poluição sonora, mas antes que se chegue a essa conclusão, é necessário investigar. Na nota técnica, o texto ressalta que “observa-se, com bastante clareza, que a aplicação estrita das normas técnicas sobre poluição sonora nos casos de celebrações originárias de matrizes africanas, é medida deveras limitada diante das peculiaridades desses ritos, nos quais os instrumentos sonoros constituem elementos caracterizadores da própria religiosidade e, de certo modo, da crença e identidade dessas comunidades”.

De acordo com o documento, o MP não pode deixar de analisar e garantir a liberdade religiosa. “O Ministério Público não pode se esquivar da tarefa de enfrentar os contornos discriminatórios que se escondem nas entrelinhas das denúncias que visam a restringir o direito à liberdade religiosa e até mesmo a impedir o exercício das manifestações litúrgicas das religiões de matriz africana”, diz o documento.

A nota foi expedida pelo Grupo de Atuação Especial de Proteção dos Direitos Humanos e Combate à Discriminação (GEDHDIS), pelo Centro de Apoio Operacional dos Direitos Humanos (CAODH) e pelo Centro de Apoio Operacional de Meio Ambiente e Urbanismo (Ceama).

Esta é a segunda nota técnica expedida pelo MP este mês. A primeira se refere ao combate a fraudes no sistema de cotas. Ao todo, serão duas notas técnicas e quatro recomendações expedidas até o final do mês, em virtude do Novembro Negro. “Esse ano, ao invés de fazermos um evento, resolvemos fazer medidas concretas”, explicou a promotora.

Racismo
Na próxima semana, uma recomendação será expedida para que a Secretaria da Segurança Pública (SSP-BA) respeite o Estatuto da Igualdade Racial, de 2014, que determinou a implantação de uma delegacia especializada em crimes de racismo e intolerância religiosa. A secretaria terá 30 dias para explicar quais medidas serão tomadas para efetivar a delegacia.

Ainda esta semana, outra recomendação será expedida para a Polícia Civil, sugerindo que os delegados tenham um cuidado maior com a tipificação dos casos de racismo e injúria racial. De acordo com a promotora, a tipificação equivocada dos crimes atrasa os processos. “Deveria ter um inquérito policial, que vai apurar o fato, encaminhar ao Ministério Público. Atualmente, o processo vai direto para o Juizado Criminal e, chegando na audiência, tem que voltar para o Ministério Público, pelo fato narrado pela vítima. Mas às vezes, as provas e as testemunhas se perdem nesse tempo e o processo não vai adiante”, explicou.

FONTE: Correio da Bahia em 22/11/2016

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