Pluralidade de crenças mostra diversidade na fé

Passo Fundo tem mais de 144 mil fiéis da igreja Católica, enquanto que outras religiões também tem seu espaço, prova disso são as igreja evangélicas que juntas somam mais de 19 mil adeptos. Neste final de semana acompanhe a primeira reportagem da série sobre a diversidade religiosa no município



Quando algo mais forte é o que move alguém, isso é denotado como fé, uma força superior que como diz o ditado “move montanhas”. Acreditar em um Deus, em uma forma espiritual é o que motiva essa fé, um conjunto de crenças onde as pessoas buscam sentido à sua existência. Dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), referentes ao Censo 2010, traçam o panorama da religiosidade em Passo Fundo. Cerca de 80% da população ou 144.573 pessoas são da igreja Católica Apostólica Romana. O número de evangélicos chega a 14.818 fiéis nas igrejas Pentecostais e 4.347 crentes nas evangélicas de Missão. Somente na Assembleia de Deus são 5.977 seguidores. Outras religiões, como Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, com 1.117 pessoas e Espírita, com 4.345 adeptos também contemplam a cidade. Os dados apontam que 3.961 pessoas não tem religião.


O filósofo, professor do curso de Filosofia da UPF, Marcelo Doro, explica que embora o tema esteja associado a crenças em entidades de nível superior, a discussão não se limita a existência e/ou natureza de Deus. “A religião é um elemento constituinte da própria humanidade. Quer dizer, a religião é um fenômeno humano. E este é, a propósito, um bom ponto de partida para uma análise isenta da religiosidade”, diz ele.


Religiosidade
O professor aponta que o ser humano, até onde é possível constatar, é o único animal que manifesta religiosidade, o que tem a ver com o fato de termos consciência da própria existência. “Uma vez que dispomos dessa consciência sentimos a necessidade de dar sentido a ela. A religião, acredito, está intimamente associada a essa necessidade que nos é peculiar. Não basta estarmos vivos, precisamos que isso faça sentido”, pontua ele.


Doro aponta que também a religião é importante para as pessoas que tem na crença um sentido para suas vidas. “Se alguém quiser saber se a religião é importante, a resposta é sim. Porque ela nos oferece, enquanto humanos, o sentido que necessitamos para conduzir a vida”, declara ele, concluindo que é possível viver ser religião, “mas aí depende de conseguirem produzir um sentido para a existência que não transcenda a faticidade crua do mero existir; ou, então, precisar suportar o peso da falta de sentido que é angustiante”, acredita ele.


Quem explica sobre a igreja Católica, uma das mais expressivas na cidade, é Dom Ercílio Simon, bispo desde 1990, que afirma: “somos igreja de Jesus Cristo, nos sentimos ligados aos apóstolos, desde Pedro, na igreja que percorre os séculos levando à humanidade a luz de Cristo”. Ele comenta que existem outras igrejas cristãs, mas não em plena comunhão com a igreja Católica. “Respeitamos todas elas e rezamos para que um dia aconteça aquilo o que Jesus disse: que todos sejam um”, pontua ele. O bispo observa que “Católicos somos no mundo cerca 1,2 bilhão e existem 800 milhões de cristão de outras igrejas, isso significa que a maior parte da humanidade ainda não conhece Cristo, por isso continua a nossa missão de anunciar Jesus ao mundo”, declara Dom Ercílio.


Segundo ele, a igreja é organizada no coração de cada um, no grupo familiar – a chamada igreja doméstica; na comunidade, no âmbito paroquial – ou comunidade de fé; também na ordem diocesana – que são o conjunto das paróquias. “Sobre todas estas, está o Papa, que cremos ser o sucessor de Pedro, escolhido por Jesus para dirigir a igreja que começava”, frisa Dom Ercílio. O culto religioso tem muitos ritos, que começam desde o batismo e nos sete sacramentos expressam todos os canais da comunicação da graça de deus. “O mais presente é a missa, para a qual todo são convidados a participar pelo menos aos domingos. Ela é sempre presidida por um sacerdote”, destaca ele.


A crença da igreja Católica, de acordo com o bispo, está em um resumo que vem sendo decorado pelos cristãos há 1700 anos. “É o que cremos: na nossa fé em Deus que é o pai criador, em Jesus Cristo o filho salvador e no Espírito Santo o santificador. Cremos na vida eterna, na ação de Deus, especialmente no amor de Deus para conosco e que o mundo pode ser melhor e por isso todo o cristão deve ser empenhando na organização desse mundo”, explica ele, enfatizando que ainda a crença abrange o que está escrito na Bíblia. “Ela ocupa um lugar especial no coração dos católicos, que devem ler e praticar o que ali está escrito”, finaliza.


Igreja Evangélica Assembleia de Deus


Uma igreja evangélica Pentecostal, a Assembleia de Deus tem como presidente em Passo Fundo e na região o pastor João Maria da Silva Hermel, que há 40 anos é pastor, além de trabalhar na área teológica, proferindo aulas. Ele explica que são duas linhas que baseiam a filosofia da empresa, a administrativa e a teológica. “A filosofia teológica é baseada fundamentalmente na Bíblia, é nosso guia, nossa orientação, é o fundamento da igreja onde nós extraímos todas as doutrinas”, pontua ele. Ao todo, são 24 doutrinas bíblicas, de salvação, da fé cristã e escatológicas.


Conforme ele, o culto é baseado nas doutrinas. “Temos o período de louvor que sempre acontece no inicio da reunião e esse louvores são baseados na Bíblia, outros em experiências cristãs vividas, outros na vida dos homens da Bíblia”, justifica. Segundo pastor, após o louvor é dado o período de oração, onde é feita a oração pelos presentes e cada um traz sua necessidade. “Temos o momento da pregação e o pregador já vem preparado para esta reunião. Na sequência temos oportunidade dos presentes fazerem decisões propósitos e voltamos a orar por essa pessoa que já ouviu a mensagem pregada”, salienta Hermel.


O culto também tem um momento da adoração a Deus, com ofertas e dízimos. “É baseado na própria Bíblia, que manda ofertar e dizimar. Claro que damos a informação aonde é aplicado essa oferta, no caso da nossa igreja, temos 62 igrejas dentro da cidade e 90% são propriedades da igreja”, justifica. Sobre a hierarquia, o pastor conta que existem presidentes mundiais, um nacional que fica em São Paulo e um estadual que fica em Porto Alegre. Além disso, a região e a cidade também tem seus presidentes, que no caso de Passo Fundo é Hermel, que também representa a região.


A cidade é dividida pela avenida Brasil em Norte e Sul, onde são dirigidas pelos co-pastores. São 32 igrejas na ala Sul e 30 na ala Norte, além de 6 distritos onde cada um tem as suas congregações, com pastores distritais e encarregados das congregações, que cuidam no bairro. “Temos fiscalização a todos os nossos obreiros e pastores. Quando se portarem mal, atuamos e disciplinamos e podem perder o cargo se não cuidarem corretamente do testemunho pessoal deles e da igreja aonde ele está atendendo”, enfatiza o pastor.


Umbanda


O dirigente espiritual Rigoberto Franceschi explica que a filosofia umbandista é complexa. “A principio acreditamos e um Deus único. Alguns o denominam por vários nomes e desse Deus surgem forças espirituais, os Orixás, que são poderes de Deus, não são espíritos, mas forças de Deus”, esclarece. Ele exemplifica falando de Ogum, que no Rio Grande do Sul é São Jorge. “É uma emanação da ordem de Deus, que ordena para que o universo ande naturalmente, para que um astro não se choque contra o outro”, observa.


No caso desta força, ele esclarece que resolve problemas de desordem. “É para abertura de caminhos, como vulgarmente se chama, além de saúde finança, emocional, enfim, todo um leque de problemas diários que são resolvidos, pedir para que as coisas se organizem, se diminua o caos”, comenta. Além da emanação da ordem, existem outros 16 Orixás com outros atributos.


Apenas na casa de Umbanda nos Franceschi é dirigente, trabalham 50 médiuns. Eles usam vestimenta branca para simbolizar e diferenciar. “É um local sagrado, por isso se usa branco”, explica ele, apontando que os encontros tem inicio no horário marcado, onde é feita a saudação às graças de Deus, pedindo saúde e paz, posteriormente é feita uma palestra sobre assuntos variados. “Depois disso, temos o toque de atabaque, para dar sonoridade aos cantos e mantras que vão sendo cantados aos orixás, enquanto os espíritos de luz incorporam os médiuns”, esclarece.


Os encontros são abertos para as pessoas que não são iniciadas da religião. “Não há cobrança e qualquer um pode fazer uma consulta, ouvir uma resposta sobre o que está buscando. Fazer um pedido ou tomar um passe energético, que é feito pelo movimento de mão ou através de estalo de dedos”, declara ele. Franceschi explica que existem vários ritos e que alguns deles se aplicam apenas aos iniciados na Umbanda, que optam por serem sacerdotes e trabalhar pela religião. “Os leigos não tem ligação com a religião, a não ser que desejem com o tempo e se anexem a casa”, conlui.


Depois que um dirigente desencarnou para a ordem superior, Franceschi fundou uma casa. “A Umbanda tem o estigma de trabalhar com o mal e as pessoas tem esse preconceito, mas a Umbanda em si é luz para se fazer o bem e qualquer coisa diferente disso não é Umbanda. Vários cultos que fazem diferente disso. Nós trabalhamos com entidades espirituais para fazer o bem”, finaliza.


Confira a entrevista com o filósofo Marcelo Doro.

Diário da Manhã: O que é religião? Como ela pode ser expressa?


Marcelo Doro: A religião é uma instituição social; é um fenômeno social; é uma estrutura de sentido coletivamente mantida para significar e regrar a existência. A religiosidade por sua vez remete a instância subjetiva: é o modo como cada indivíduo lida com sua espiritualidade, com forte ou fraca ligação com a religião enquanto instituição.


DM: O que é a fé? Porque algumas pessoas são movidas pela fé e seguem à risca os preceitos de sua religião?


MD: A fé é o elemento subjetivo (pessoal) da religiosidade. Poderíamos dizer, de forma bem ampla, que a religião contém uma teoria do sentido, que se desdobra em ensinamentos e regramentos que precisam ser assumidos por cada pessoa em particular. A fé é o elemento dessa aceitação. Um tipo especial de aceitação, que não depende propriamente de convencimento, de razões; acontece como que por empatia. Aceitamos uma religião quando sentimos que ela atende a nossas necessidades espirituais, ou seja, quando ela dá sentido aos elementos que precisamos significar. Mas é importante que fique claro: isso não é um processo tipicamente racional, é intuitivo. Como a religião ocupa o espaço da significação da existência, a ligação do indivíduo à religião (a intensidade de sua devoção) será proporcional a importância para a condução de sua vida. Algumas pessoas recorrem a religião para orientar até as questões mais triviais do cotidiano, elas tem uma grande dependência da religião que se traduz na alta intensidade de sua fé. Outras conseguem lidar com muitos dos problemas da existência sem apelar para os preceitos religiosos. Para estas, a religião ocupa um patamar mais restrito e, daí, sua fé parecerá menos intensa (e um tanto mais personalizada, se é que podemos dizer assim). E tudo isso, claro, associado a fatores culturais.


DM: A religião católica é superior a todas as outras, mas vem perdendo seu espaço com a chegada de novas igrejas. Porque isso acontece, o que desmotiva os católicos?


MD: Como já assinalei, a religião atende a certas necessidades humanas. Essas necessidades permanecem idênticas em elemento essencial, mas o contexto em que elas precisam ser atendidas se altera e as religiões teriam que observar isso. Se a religião deixa de atender as necessidades/expectativas/anseios dos indivíduos ela perde força e, então, a tradição já não será suficiente para mantê-la em alta.


DM: Ainda há preconceito entre as religiões? Porque?


MD: No Brasil, felizmente, isso já não é tão intenso. Mas ainda existe, enquanto dificuldade de lidar com a diferença.


DM: Porque há pessoas sem religião? Em que elas acreditam?


MD: Há pessoas sem religião que são religiosas, que cultivam a espiritualidade de uma forma não institucionalizada. Ter uma religião e desenvolver a religiosidade não são necessariamente a mesma coisa, e uma não implica a outra. E, por certo, existem também pessoas que não tem (não seguem) uma religião e nem cultivam qualquer religiosidade. Elas não sentem a necessidade de crer em algo. Ou, melhor, elas acreditam que não há nada para acreditar, que a falta de sentido é um fato. É outro jeito de compreender a vida e de conduzi-la, nem melhor, nem pior.


Perfil da religiosidade em Passo Fundo


Católica: 144.808
• Católica Apostólica Romana: 144.573 pessoas
Evangélica de Missão: 4.347 pessoas
• Luterana: 2.344 pessoas
• Presbiteriana: 70 pessoas 
• Metodista: 475 pessoas
• Batista: 798 pessoas
• Adventista: 660 pessoas
Evangélicas Pentecostais: 14.818 pessoas
• Assembleia de Deus: 5.977 pessoas
• Igreja do Evangelho Quadrangular: 3.099 pessoas
• Igreja Universal do Reino de Deus: 1.134 pessoas
• Igreja Deus é Amor: 324 pessoas
Outras
• Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias: 1.117 pessoas
• Testemunhas de Jeová: 584 pessoas
• Espírita: 4.345 pessoas
• Umbanda: 786 pessoas
• Candomblé: 101 pessoas
• Judaísmo: 30 pessoas
• Budismo: 62 pessoas
• Islamismo: 159 pessoas
Sem religião: 3.961 pessoas
• Sem religião: 3449 pessoas
• Ateu: 491 pessoas


FONTE: Diário da Manhã em 07/07/2012

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