Após 93 anos, peças sagradas para o candomblé são identificadas e catalogadas
Foram perdidas durante batidas policiais no candomblé do 'curandeiro' Antônio Osùmàrè, em 1922
Noite de 3 de outubro de 1922. O delegado da 1ª
Delegacia de Salvador cerca o candomblé do “curandeiro” Antônio
Osùmàrè, que funcionava no Engenho Velho da Mata Escura – hoje, Casa de
Oxumarê, na Federação – e prende 15 pessoas. Os “apetrechos bellicos”,
como foram chamadas as peças do culto do terreiro de candomblé, também
foram levados para a 1ª Delegacia, que ficava em Ondina.
De acordo com o Babá Egbé Leandro, da Casa de Oxumarê, aquela foi apenas uma das mais de 50 batidas sofridas. “O terreiro sofreu muito, teve uma perda considerável da sua memória por conta da pressão policial”, afirma.
Uma das peças levadas foi o objeto central do culto, a Coroa de Bàyání. Noventa e três anos se passaram desde aquela batida e é possível que as peças apreendidas naquela segunda-feira no Ilé Osùmàrè Aràká Àse Ògòdó tenham se perdido ou sido destruídas. Mas algumas delas podem fazer parte de uma coleção de cerca de 200 peças que sobreviveram e estão sendo conservadas e catalogadas pelo Museu Afro-Brasileiro (Mafro/Ufba). A Coroa de Bàyání, segundo a coordenadora do Mafro, Graça Teixeira, não foi para lá.
De acordo com o Babá Egbé Leandro, da Casa de Oxumarê, aquela foi apenas uma das mais de 50 batidas sofridas. “O terreiro sofreu muito, teve uma perda considerável da sua memória por conta da pressão policial”, afirma.
Uma das peças levadas foi o objeto central do culto, a Coroa de Bàyání. Noventa e três anos se passaram desde aquela batida e é possível que as peças apreendidas naquela segunda-feira no Ilé Osùmàrè Aràká Àse Ògòdó tenham se perdido ou sido destruídas. Mas algumas delas podem fazer parte de uma coleção de cerca de 200 peças que sobreviveram e estão sendo conservadas e catalogadas pelo Museu Afro-Brasileiro (Mafro/Ufba). A Coroa de Bàyání, segundo a coordenadora do Mafro, Graça Teixeira, não foi para lá.
A
identificação e a origem das mesmas peças são objeto de pesquisa do
museólogo Marcelo Bernardo da Cunha, que já foi coordenador do Mafro.
Ele estuda o contexto histórico e de exposição das peças e busca
diferenciar as ritualísticas das decorativas. Entre elas, há figas,
bonecas, colares, atabaques, estatuetas, assentamentos — estes,
certamente tirados em batidas policiais.
Cenas
como aquela se repetiram incontáveis por décadas, capitaneadas pela
Delegacia de Jogos e Costumes. Por anos, as peças foram levadas para
espaços como o Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (IGHB) e o
Museu Estácio de Lima, no Instituto Médico Legal Nina Rodrigues.
Desde
2007, o Brasil celebra no dia 21 de janeiro o Dia de Combate às
Intolerâncias Religiosas. Foi neste dia, no ano 2000, que a ialorixá Mãe
Gilda de Ogum, do terreiro Ilê Axé Abassá de Ogum, em Salvador, morreu
em decorrência das agressões ocasionadas pela intolerância religiosa.
MostraSob
a guarda do Mafro desde 2010, as peças agora vão compor um catálogo e,
se a vontade dos pesquisadores virar realidade, serão expostas em
contexto próprio – a coleção ainda não está acessível ao público. Isso
porque o Mafro, que detém as peças até 2020, tem espaço para expô-las,
mas falta orçamento.
O Instituto
do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (Ipac) disse ter interesse
na exposição. No entanto, ainda não foi procurado pela Ufba para uma
possível parceria.
Foi a
Secretaria de Promoção da Igualdade Racial (Sepromi), que intermediou a
ida das peças para o Mafro. Ainda segundo a Sepromi, o desejo é poder
devolver as peças aos terreiros de origem. Em caso de impossibilidade, a
melhor alternativa é expô-las. Outras peças vindas de terreiros de
candomblé já estão expostas: há máscaras e estatuetas no IGHB.
De
acordo com o antropólogo Renato da Silveira, algumas das peças vieram
da África. Boa parte delas foi retirada dos terreiros durante batidas
policiais no século passado. Conforme o museólogo Marcelo Bernardo da
Cunha, que pesquisa a origem e o significado das peças, atabaques eram
muito apreendidos.
“Uma
das sustentações da polícia para a perseguição era a perturbação da
ordem pública. O atabaque era a prova cabal de que eles estavam fazendo
barulho”, diz o museólogo. A grande dificuldade é, hoje, quase um século
depois de algumas das invasões, saber de onde cada peça veio.
Em
2010, quando as peças chegaram ao Mafro, o Tata Anselmo, do Terreiro
Mokambo, a pesquisadora Ieda Machado e a ialorixá Mãe Stella de Oxóssi,
do Ilê Axé Opó Afonjá, avaliaram as peças e concluíram que não era
possível identificar a origem. Pelo menos não tanto tempo depois.
HistóriaNo
final de outubro, uma das peças apreendidas pela polícia, a cadeira que
pertenceu ao sacerdote Severiano Manuel de Abreu, o Jubiabá, do
Terreiro Mokambo, foi devolvida aos seus ancestrais diretos. A cadeira
passou 95 anos IGHB.
O nome
de Jubiabá, entalhado na própria cadeira, foi fundamental para a
identificação do terreiro de origem. “Na intenção de achincalhar,
colocaram fotos em todos os jornais. Era impossível dizer que não era a
cadeira de Jubiabá”, afirma Tata Anselmo, sacerdote do Mokambo.
“Se passaram
95 anos. Hoje, elas são históricas, mas naquela época aquelas peças não
tinham esse valor. A não ser que se faça uma pesquisa nos jornais ou que
a pessoa chegue e diga: ‘isso é da minha casa’”, diz a sacerdote.
Mas
nem com o passar dos anos, as peças tiveram o devido respeito e
cuidado. No Mafro há uma maraca em pedaços. “É um instrumento de
afirmação, para mostrar o que o descaso faz”, diz a coordenadora Graça
Teixeira.
Para
o antropólogo Renato da Silveira, as peças são um documento da
perseguição religiosa. “A primeira coisa que a gente tem que ressaltar é
o interesse oficial em guardar essas peças como uma espécie de
documento à história do Brasil, ainda que um documento triste”, diz.
Peças foram expostas em contexto de preconceitoPor anos, objetos de culto do candomblé fizeram parte do acervo do Museu Estácio de Lima, do Departamento de Polícia Técnica (DPT), dedicado à Medicina Legal, Antropologia, cultura e Etnologia.
Peças foram expostas em contexto de preconceitoPor anos, objetos de culto do candomblé fizeram parte do acervo do Museu Estácio de Lima, do Departamento de Polícia Técnica (DPT), dedicado à Medicina Legal, Antropologia, cultura e Etnologia.
As
peças de candomblé, assim como um acervo de Cangaço, foram expostas em
meio a corpos dissecados, armas, máquinas de falsificação, anomalias
genéticas.
Após uma luta do povo de santo, as peças foram retiradas daquele contexto e, em 2010, levadas para o Mafro. “Foi preciso um movimento para se dar destino digno para aquilo ali. O Estácio de Lima era representante no Brasil do racismo científico do século XIX.
A captura desses despojos era depositada naquele museu. O que se espanta é que tenham ficado tanto tempo lá. Isso revela que nossa elite ainda tem a cabeça colonialista”, diz o antropólogo Renato da Silveira.
Após uma luta do povo de santo, as peças foram retiradas daquele contexto e, em 2010, levadas para o Mafro. “Foi preciso um movimento para se dar destino digno para aquilo ali. O Estácio de Lima era representante no Brasil do racismo científico do século XIX.
A captura desses despojos era depositada naquele museu. O que se espanta é que tenham ficado tanto tempo lá. Isso revela que nossa elite ainda tem a cabeça colonialista”, diz o antropólogo Renato da Silveira.
O
antropólogo e etnólogo Ordep Serra contesta o caráter de museu do
espaço. “Um museu tem que ter uma ficha museográfica. Se não tem, não é
museu. Eles sumiram com os documentos. Eu lembro que embaixo das peças
tinha escrito o nome do terreiro de onde tinham vindo”.
Para ele, o Estado tem uma dívida com todos os cidadãos por conta do contexto em que as peças foram expostas. Procurados pelo CORREIO, a Secretaria da Segurança Pública da Bahia e o DPT não souberam responder se as peças tinham ou não identificação por terreiro.
Para ele, o Estado tem uma dívida com todos os cidadãos por conta do contexto em que as peças foram expostas. Procurados pelo CORREIO, a Secretaria da Segurança Pública da Bahia e o DPT não souberam responder se as peças tinham ou não identificação por terreiro.
FONTE: Correio da Bahia em 24/01/2016
Foto: Marina Silva/Correio
Nada contra, mas nem a favor. Se religião Afro fosse tão Importante vcs não seriam Vendidos cono Escravos pelos próprios conterrâneos seus nos Portos Africanos. Portugueses e Negreiros Transportadores não adentravam pelo continente Africano para cassa-los. Eles compravam nos locais de Embarque no Atlântico.
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