Caminhada pela liberdade

O Sol forte e o calor intenso não impediram que uma multidão se concentrasse na orla de Copacabana, zona Sul do Rio, para a 5ª Caminhada em defesa da liberdade Religiosa, promovida pela Comissão de Combate à Intolerância Religiosa. Ao som dos Filhos de Ghandi, os versos “Umbanda é paz e amor é um mundo cheio de luz” do hino da Umbanda abriram o evento. Estavam presentes não só comunidades de terreiros de Candomblé e Umbanda como Mulçumanos, Católicos, Judeus, Budistas, Kardecistas, Hare Krisnas, entre outras tradições de fé e pessoas sem fé pela liberdade. Os organizadores estimam que mais de 200 mil pessoas participaram. Um aumento de mais de 20.000 em relação ao ano passado.


A caminhada pediu o fim do preconceito e de atos de violência contra religiosos, além de cobrar políticas públicas para combater a discriminação. Uma das demandas dos participantes é a aplicação da Lei Nº 10.639/03, que prevê a implementação dos estudos das histórias da África e da Cultura Afro-brasileira nas escolas de todo o País, além do Plano Nacional de Combate à Intolerância Religiosa.

Ulisses de Jesus esteve pela primeira vez na caminhada e levou uma faixa que pedia união. Para Ulisses, que veio do Ile Ase Togunja, localizado em Realengo, é importante participar da caminhada porque “quanto mais gente, mais mobilização, mais chances de liberdade e menos discriminação”.

Com o mesmo sentido, o Babarolixá Sérgio de Oxossi e a Equede Rosangela de Oxum do Ilê Axé Ode Omorobe de São João de Meriti participam desde da primeira edição do evento: “Representantes de todas as religiões devem estar presentes na caminhada”, disse o Babarolixá.

Além de união, muitos acreditam que a caminhada é um espaço de conscientização, de acordo com o que explicou o Babalorixá Célcio da Ordem Espírita Cobras Coral. O centro participa da caminhada há quatro anos. “É um espaço de conscientização que reúne representantes de muitas religiões e que serve para mostrar que o mundo tem espaço para todos,” disse a liderança religiosa. Para os jovens Larissa Fernandes e Vitor de Souza, “a caminhada é muito importante para conscientizar as pessoas de que é necessário respeitar todas as religiões e que a nossa religião já faz isso.”. Larissa que levou o filho de meses de idade acha que o evento também é um momento que espalha axé e alegria.

Israel Evangelista concorda com os jovens, mas ressaltou que os adeptos de religiões de matriz africana precisam aumentar ainda mais sua participação em eventos como esse para que o alcance da causa seja maior. Israel destacou que o caso Mãe Gilda foi um marco que despertou toda essa mobilização. Em outubro de 1999, o jornal Folha Universal publicou uma foto de Mãe Gilda em uma matéria entitulada “Macumbeiros charlatões lesam o bolso e a vida dos clientes”. KOINONIA assessorou Jaciara Ribeiro, filha de Mãe Gilda, que processou a Igreja Universal.

O diretor executivo de KOINONIA, Rafael Soares também lembrou o caso Mãe Gilda e destacou o papel das religiões na luta pela garantia de direitos: “sou do candomblé e estou aqui com duas camisas, a da militância pessoal e a da instituição de que faço parte. Participamos do processo político pela superação da intolerância religiosa desde que KOINONIA nasceu. Fomos protagonistas na defesa do Caso Mãe Gilda que motivou o dia nacional de combate à intolerância religiosa. As Caminhadas são parte da motivação geral da sociedade civil de que haja liberdade religiosa de fato e não só em leis que não pegam, tema que é agenda efetiva dos Direitos Humanos. Estamos aqui nessa caminhada reafirmando o que retomamos coletivamente na Cúpula dos Povos, de que os religiosos têm uma história de solidariedade e afirmação dos Direitos Humanos em sua integralidade, os DHESCA [Direitos Humanos Civis e Políticos, Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais] e que esperamos que isso siga de mãos dadas com caminhadas como essa Quinta e com muitas mais nas bases da sociedade, capazes de promover a mudança de toda cultura do medo e das intolerâncias, democracia e paz. Essa foi a marca do movimento Religiões por Direitos na Cúpula em junho.”


O Babalawo Ivanir dos Santos, organizador do evento, também destacou a temática dos direitos: “a caminhada tem todo sentindo de garantia de direitos. Ela reivindica o respeito à diversidade e é uma alavanca para conquista de direitos.”

Também fez parte das ações ligadas à caminhada uma carta-compromisso proposta aos candidatos à prefeitura do Rio. A criação de uma ouvidoria para apurar denúncias de ataques contra lideranças e templos é um dos compromissos do documento. De acordo com informações da agência Brasil, apenas o candidato Marcelo Freixo (Psol) que participou da caminhada assinou o documento. Eduardo Paes (PMDB) e Otávio Leite (PSDB) enviaram representantes, que não puderam assinar. A candidata Aspásia Camargo (PV) cruzou com as lideranças religiosas em Copacabana, mas não se pronunciou.

A ministra da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Luiza Bairros também participou da caminhada. O evento foi encerrado com um show da cantora Margareth Menezes.

Origem da caminhada:
A Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR) foi criada em 2008, quando religiosos de matriz africana foram expulsos de uma comunidade na Ilha do Governador por traficantes convertidos a segmentos neopentecostais dentro de presídios. Um protesto nas escadarias do prédio da Assembleia Legislativa iniciou o processo para as caminhadas anuais. Segundo os organizadores, 20 mil pessoas participaram da primeira caminhada; 80 mil no segundo ano, 120 mil na terceira marcha; e 180 mil no ano passado.


Carta Compromisso contra a Intolerância Religiosa
Eleições 2012

Apresentação: A Carta Compromisso contra a Intolerância Religiosa é uma iniciativa da  Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR) – formada por candomblecistas, umbandistas, católicos, protestantes, judeus, muçulmanos, hare Krshnas, seguidores da Fé Bahá’í, do Santo Daime, Wiccans, kardecistas, ciganos, budistas, agnósticos; e é resultado do debate “Eleições Municipais e Luta contra a Intolerância Religiosa”, que diante momento eleitoral brasileiro, procurou articular eleições e religião.

O papel da CCIR, desde a primeira manifestação em março de 2008, tem sido defender os direitos de liberdade religiosa para todos, destacando dentre suas ações, a Caminhada em Defesa da Liberdade Religiosa, realizada sempre no terceiro domingo do mês de setembro, na Orla de Copacabana, onde reúne centenas de milhares de religiosos, vindos em caravanas de várias cidades deste país.
A Carta Compromisso contra a Intolerância Religiosa tem o propósito de pautar na agenda dos futuros dirigentes municipais o combate à intolerância e a defesa ao direito de liberdade religiosa. Tem como ponto de partida a compreensão de que a cidade no momento eleitoral é objeto central de disputa e discussão dos candidatos. condição esta, oportuna para se delinear as estratégias políticas de atuação e as definições de agendas prioritárias dos programas de governo.

Deste ponto deriva a reflexão sobre que cidade se quer e para quem se está construindo essa cidade?
Nesta linha de raciocínio, a assinatura desta carta-compromisso permite originar e consolidar políticas públicas de caráter inclusivo e não discriminatório, e acima de tudo, democrático.  E por conseguinte, ajuda a construir uma cidade para todos!

CARTA-COMPROMISSO CONTRA A INTOLERÂNCIA RELIGIOSA
Cidadãs e cidadãos,

Eu, _______________________________________________, candidata(o) a prefeito(a) da cidade de _______________________________, firmo aqui o compromisso público de atuar pelo combate a intolerância religiosa, respeitando a diversidade e reconhecendo as diferenças dos brasileiros, vítimas da intolerância, impedidos de exercer plenamente seus direitos, de realizar livremente suas práticas religiosa e de professar sua fé.
Desde já assumo que o combate à intolerância religiosa será uma das prioridades do meu mandato.

Considerando que:
1. O Brasil é um país de Estado Laico

2. A Constituição de 1988 consagra no Artigo 3º, inciso IV que um dos objetivos principais da República é combater o preconceito e a discriminação. Em seu artigo 5º, inciso IV,  defende a livre manifestação de pensamento; no artigo 5º, inciso VI, a inviolabilidade a liberdade de consciência e de crença; no artigo 5º, inciso VIII, a não privação de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei; e no artigo 5º, inciso IX, onde é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.

3. O  Código Penal brasileiro prevê punição a incitações a violência, como agressões ou até mesmo homicídios, por motivos religiosos.

4. A Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, alterada pela Lei nº 9.459, de 15 de maio de 1997, tipifica de crime a prática de discriminação ou preconceito contra religiões.

5. As liberdades de expressão e de culto são asseguradas pela Declaração Universal dos Direitos Humanos art. XVIII, que expressa que “toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião”, combinado com o artigo XIX, também da declaração dos direitos humanos, que expressa que “toda pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão”.

6. A Convenção Internacional Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial de 1965, feita pela ONU e ratificada pelo Brasil em 1968, em seu artigo 1º, estabelece discriminação racial como toda forma de distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tenha por objeto ou resultado anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício em um mesmo plano (em igualdade de condição) de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro campo da vida

7. O Estado brasileiro como forma de reconhecimento da intolerância religiosa no país, instituiu o dia 21 de janeiro como Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, por meio da Lei nº 11.635, 27/12/2007.

Assumo, caso seja eleito(a)
1) Não permitir influências de qualquer tipo nas decisões, que impeçam de aprovar leis ou implementar ações necessárias para combater a intolerância religiosa;

2) Atuar na articulação política pela implementação de ações e aprovação de leis que contribuirão para erradicar práticas de discriminação ou preconceito contra religiões.

3)  Garantir proteção aos defensores dos direitos humanos e líderes religiosos que atuam no combate à intolerância religiosa e na defesa da liberdade a manifestação religiosa;

4) Dar proteção ao que é religioso e sagrado de cada cidadão.

5) Assegurar atendimento e defesa a todos os segmentos que venham a ter seu espaço religioso violado e/ou sofram práticas de intolerância religiosa.

6) Reconhecer os diferentes saberes das representações religiosas, bem como compreender suas raízes históricas, defendendo, dentre outros contextos, o ensino obrigatório da História da África e da História e das Culturas Afro-brasileiras nas escolas das redes pública e privada do país, a luz da Lei 10.639/03.

7) Criar estruturas de controle social contra a Intolerância Religiosa, em especial de Ouvidoria Municipal.

8) Destinar recursos e garantir apoio político para a manutenção das ações de fiscalização de denúncias que resultam no combate a intolerância religiosa e na defesa.

9) Estender às diversas áreas da cidade a compreensão da paz, como espaço de convivência das diferenças e da diversidade, eliminando todas as formas de discriminação, em especial a religiosa.

Por fim, se eu me desviar destes compromissos, asseguro que renunciarei ao meu mandato, e em caso de qualquer pessoa que ocupe cargo público sob minha responsabilidade será prontamente exonerado.

Sem mais, subscrevo-me.

__________________, __ de ____________ de 2012
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FONTE: KOINONIA Presença Ecumênica e Serviço em 18/09/2012


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