Sim, sou filho de santo

Campanha quer convencer adeptos de religiões afro-brasileiras a assumirem suas crenças no Censo 2010

O Paraná tem cerca de 146 mil seguidores de religiões afro-brasileiras, segundo o Conselho Mediúnico do Brasil (Cebras), que está fazendo um mapeamento dos terreiros de umbanda e casas de candomblé do estado. Mais do que identificar esses locais, o conselho quer convencer cada fiel a assumir sua crença no 12º Censo Demográfico, que começa em agosto. Nas estatísticas oficiais, o número de “filhos de santo”, como são chamados os adeptos dessas religiões, é 20 vezes menor. No último censo populacional do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2000, só 6.859 habitantes se declararam umbandistas ou candomblecistas.

O desafio, segundo o presidente do Cebras, Dorival Braz Simão, é fazer com que os seguidores deixem o preconceito de lado e assumam sua religião. Por medo de retaliação no ambiente de trabalho ou até mesmo de amigos, muita gente acaba se declarando católica ou espírita, diz ele. “Não queremos repetir os resultados do censo de 2000. As religiões afro-brasileiras têm de realmente mostrar sua realidade”, diz.

Até o momento, o pré-levantamento mostra que 687 centros atuam regularizados no Paraná. Informalmente, o número chega a 2.930. Cerca de 90% são de terreiros de umbanda. Para fazer o mapeamento – que deve custar em torno de R$ 600 mil –, o conselho tentou obter recursos do Ministério da Cultura, mas não teve o pedido aprovado. Segundo Simão, estados como Pernambuco, Bahia, Rio Grande do Sul e Mato Grosso têm projetos semelhantes, mas com apoio governamental.

O conselho pretende obter apoio dos terreiros para a campanha. Em blogs, sites de terreiros de umbanda e portais de relacionamento já é possível perceber a preocupação diante dos resultados censitários de 2000 que apontavam menos de 1% de praticantes de umbanda e do candomblé no Paraná.

A universitária Franciele Pedrosa, 25 anos, prestes a se formar em História, afirma que a campanha estadual pode traçar novos rumos para a religião umbandista. Na opinião dela, a religião – genuinamente brasileira, conforme os estudos desenvolvidos em sua monografia de conclusão de curso – tem respeito no Paraná. Mas ainda sofre preconceito por causa do medo do desconhecido. “É uma mudança social, paulatina, mas que fará com que outras religiões tenham outros olhos para a prática”, diz.

Franciele é uma conhecedora da religião. Seu trabalho de conclusão do curso foi sobre a Umbanda Sagrada em uma Sociedade Profana, traçando o aspecto histórico da religião a partir da década de 1980.

Pertencimento

O pai de santo e major da Polícia Militar Lúcio Fortes Moreira Filho, 45 anos, acredita que a grande maioria dos praticantes da umbanda deverá dizer que é integrante da religião. Na sua opinião, vem crescendo, ano a ano, o orgulho de ser umbandista. Como incentivo, banners digitais estão sendo disseminados entre sites que falam sobre a umbanda para que os adeptos assumam sua religião no próximo censo. “As pessoas ainda se ressentem de dizer que são umbandistas por motivos profissionais, principalmente.”

Em dois dias da semana, Moreira Filho atende em média mais de 100 pessoas em sua casa. No entanto, o sacerdote afirma que a maioria das pessoas que procura atendimento ainda se autodenomina como “simpatizante” e não adepto da religão. Ele acredita que o sincretismo existente leva muitos a dizerem que são espíritas ou, até mesmo, católicos.

Ao ser questionado sobre sua religião, um dos integrantes da casa dá a ideia da confusão nas estatísticas. A resposta de um jovem fiel, de 14 anos, engrossa a fileira dos espíritas; não dos umbandistas. Na escola e entre amigos, não tão íntimos, ele diz que é espírita por receio de sofrer preconceito.
Uma funcionária pública, que pediu para não ser identificada, diz que pretende assumir sua religião ao Censo 2010. Mas, para a família, a situação é diferente. “Todos são católicos e não aceitam”, justifica.

Em contrapartida, há outros que não se importam em dizer qual religião seguem. É o caso do major reformado Wilson Romero, 57 anos. Há quatro anos, frequenta o local. Chegou por problemas de saúde de um familiar. Os filhos não vêm por preconceito, conta. A enfermeira Gretta de Barros, 28 anos, também não se importa de dizer que é umbandista, mesmo confirmando que no local onde trabalha poucos sabem de sua escolha religiosa.

FONTE: Gazeta do Povo em 01/05/2010

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