Religiosos criticam plano de proteção

O Plano Nacional de Proteção à Liberdade Religiosa, cujo lançamento foi adiado pela ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, para evitar problemas com católicos e evangélicos no ano eleitoral de 2010, também não agradou a adeptos das religiões afro-brasileiras, que o consideraram decepcionante. “Você dá concessões de rádio e televisão para os neopentecostais e me dá cesta básica e mapeamento? Eles vão usar o rádio e TV para me atacar, me chamar de demônio. Isso é desigual”, reagiu Ivanir dos Santos, integrante da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa do Rio de Janeiro. Para ele, o adiamento do anúncio - revelado na edição de ontem do jornal “O Estado de S. Paulo” - também aconteceu devido à recepção fria que o plano teve dos credos que supostamente seriam beneficiados.

“Não queremos um plano que só fale em assistência, queremos um plano que nos dê poder”, afirmou ele. Santos, que teve acesso ao plano e chegou a ser convidado para ir a Brasília participar do seu lançamento, cobrou do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a realização de uma reunião da comissão com ministros para discutir a proposta. O encontro, afirmou, foi prometido por Lula aos ativistas em 20 de novembro de 2008, Dia Nacional da Consciência Negra, mas ainda não aconteceu. “Quero contribuir para um plano, mas um plano para valer”, afirmou ele, reclamando da falta de outras medidas. “Pergunta o que tem no Orçamento da União para implantar a lei 10.639/203, que ordena o ensino de história da África nas escolas: nada. Quem mais se opõe a isso são os neopentecostais, dizendo que vão ensinar macumba nas escolas”, disse ele. Outra lei de cumprimento adiado é a 11.645, relativa ao ensino de cultura indígena.

“O plano é importante, e é necessário que seja lançado”, defendeu, destacando que a proposta resultou de encontro da comissão com Lula, na mesma ocasião em que o presidente prometeu a reunião. “O que me chamou a atenção foi a reação de um setor neopentecostal, com um pastor dizendo que o governo não deveria se meter no assunto. Esses segmentos têm concessões públicas de rádio e televisão. Às vezes, igrejas recebem terrenos públicos para se instalarem. Têm também hospitais com convênios com o SUS, que recebem verbas públicas. Acabaram de aprovar uma lei para transformar o gospel em questão cultural, para ter incentivos fiscais da Lei Rouanet. E quando se fala em um plano para combater a intolerância religiosa, o pastor se coloca contra?”

Representantes da comissão e de órgãos que atuam no setor, como Ministério Público e Polícia Civil, participaram ontem do lançamento de um dossiê, preparado pelos antropólogos Ana Paula Miranda e Fábio Reis Mota, da Universidade Federal Fluminense (UFF), sobre 17 casos de intolerância no Rio - nove em 2008, oito em 2009. Reis reconheceu que o número, levantado a partir de inquéritos e processos, é pequeno, mas destacou que há um alto grau de subnotificação.

Adiamento provoca divergências

Para representantes da umbanda e do candomblé, a decisão da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, de protelar o anúncio do Plano Nacional de Proteção à Liberdade Religiosa é parte de uma tradicional marginalização das religiões afro-brasileiras. “Somos sempre a parte mais fraca de todas as raças, de todas as religiões. Estamos sempre à margem”, protestou o presidente do Superior Órgão de Umbanda do Estado de São Paulo (Souesp), Milton Aguirri. O plano, que deveria ter sido anunciado ontem, legalizaria os imóveis em que funcionam terreiros de umbanda e candomblé , além de prever o tombamento de templos dessas religiões.

Para Muniz Sodré, presidente da Fundação Biblioteca Nacional, a derrota política indica a pouca representação da umbanda e do candomblé. O presidente da Federação Umbandista do Grande ABC, Ronaldo Linaris, encarou a suspensão do anúncio do plano como “violência à Constituição”.

Representantes de igrejas evangélicas defendem a tese de que o governo não deveria se preocupar em legalizar os terreiros neste momento. “Em ano de eleição, mexer em questões religiosas só serve para constranger todas as partes”, disse o bispo Manoel Ferreira, presidente da Convenção Nacional das Assembleias de Deus no Brasil (Conamad). Ele afirmou, contudo, ser favorável ao plano. A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) afirmou que não vai se manifestar sobre o projeto.

FONTE: Tribuna do Norte em 22/01/2010

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